Decisão faz determinações à empresa Guamá Tratamento de Resíduos
O desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto, da 2ª Turma de Direito Público, deferiu pedido de tutela provisória de urgência, nesta quarta-feira, 31, formulado pelo Estado do Pará, Município de Belém, Município de Ananindeua e Município de Marituba. Foi determinado que a empresa Guamá Tratamento de Resíduos realize todas as obras de engenharia inerentes às etapas 2 e 3 mencionadas em Nota Técnica nº 38965, elaborada pelo órgão ambiental estadual, com fundamento no documento de 2023/13305, também anexado aos autos,
Além disso, foi determinado à empresa o emprego de técnicas necessárias à prorrogação do funcionamento do CPTR de Marituba, inicialmente por mais 3 (três) meses, conforme pleiteado pelos requerentes, cujo preço da prestação dos serviços de tratamento de resíduos será no valor já fixado em decisão (Processo n.º 0804251-03.2019.8.14.0000), “considerando, como já dito, a natureza estrutural do vertente processo, emitindo o órgão fiscalizador (SEMAS-PA), uma vez preenchidos os requisitos legais pela CPTR de Marituba, tanto para a obra e sua conclusão, caso já não tenha ocorrido, como para a continuidade da operação, em tudo observadas as formalidades legais, os documentos técnicos necessários que permitam a continuidade do serviço essencial, anexando, incontinenti, toda a documentação expedida
nos autos processuais”.
Também foi determinado pelo desembargador Luiz Neto que a empresa promova o tratamento integral do estoque do chorume, com a apresentação de cronograma, que será avaliado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS-PA), e comunicado a este relator.
“Por sua vez, considerando o pedido de homologação do III Aditivo ao Acordo realizado entre os entes públicos signatários, e, atendendo às diretrizes dos artigos 7º e 10 do CPC/2015 e art. 933 do CPC/2015, determino a intimação do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, na pessoa do Ilmo. Procurador de Justiça vinculado ao feito, Dr. Waldir Macieira para, querendo, no prazo de 5 (cinco) dias, se manifeste acerca da transação entabulada”.
Em decisão, o relator escreveu que quanto ao pedido formulado na letra “d” deverá ser apreciado a posteriori, visto que, em princípio, incompatível com o deferido acima. O item “d” formulado pela partes requeria determinação “à GUAMÁ a obrigação de continuar a receber os resíduos sólidos oriundos dos Municípios de Ananindeua, Belém e Marituba, inicialmente até a conclusão da Concorrência Pública nº 02/2023/SESAN/BELÉM, ocasião em que outras soluções emergenciais poderão ser viabilizadas e, por conseguinte, será viável fixar o prazo inicial e final para transição e desmobilização da CTR Marituba”, escreveu.
“Esclareça-se, ainda, que este relator, a qualquer momento, de forma contínua ou específica, poderá se valer de experts para acompanhar, às expensas das partes, as diligências processuais e também qualquer outra situação da calendarização e/ou atos da parte ou do Judiciário, funcionando como fiscalizador do Juízo para a solução definitiva da pendenga que é complexa por natureza, sendo certo que os experts terão livre acesso a toda e qualquer documentação, reunião, tratativas, envolvendo a solução a ser implementada pelos Peticionantes, de tudo sendo mantido informado este relator”, afirmou o relator.
E continua: “Da mesma forma, qualquer solução a ser empreendida deverá passar pela coleta de recicláveis, pela observância das normas técnica do resíduo sólido a ser depositado no novel aterro metropolitano, pela indicação precisa da fonte de receita para manter sustentável a coleta e deposição dos resíduos sólidos, dentre outras questões”.
O desembargador ressalta que a tutela de urgência requerida pelas partes de forma conjunta encontra previsão no artigo 300 do Código de Processo Civil. “Portanto, a concessão dessa medida depende da existência de relevantes fundamentos e provas capazes de demonstrar a probabilidade do direito (fumus boni iuris), bem como a possibilidade de ineficácia do provimento ou risco de causar dano, caso ela seja deferida apenas ao final da ação(periculum in mora)”.
De acordo com o relator, “no presente caso, conforme por mim já explanado, se trata de problema (ou ainda, de processo) complexo, estrutural, no qual o Judiciário, com os partícipes da lide, busca soluções sustentáveis, concretas e eficazes, para que não tenhamos os problemas que todos estamos a vivenciar e que, como todos sabem, vêm da gênese de soluções açodadas e sem critérios técnicos, e que não foram gestadas pelo Judiciário. E o Judiciário também não impede o exercício do direito de ação por quem quer que seja. Porém, por óbvio, sempre com a observância do devido processo legal
substancial.
Com isso, observa que “daí, portanto, a necessidade da prorrogação das atividades do aterro sanitário de Marituba, de acordo com os expedientes técnicos dos órgãos estatais de licenciamento e fiscalização. Aliás, em processos estruturais, as decisões não são únicas. Elas são em cascatas. Provimentos em cascata com o fito de resolver cada problema que surge no decorrer da lide, fato que, aliás, tem albergue no próprio artigo 493, do Código de Processo Civil.
Em decisão, o relator destaca que “mais uma vez, voltando ao cerne da questão, apesar das tratativas havidas, não houve êxito na definição desse mister, o que, de fato, acarretaria, como acarretou, em tese e em concreto, a possibilidade de afronta ao princípio administrativo da continuidade no cumprimento dos serviços públicos essenciais à população, bem como na ocorrência de um estado de emergência sanitária, o que não pode ser admitido e deve ser resolvido, ante a inércia das administrações municipal.
“No presente caso, inexiste qualquer outro local disponível e preparado para a deposição/disposição dos resíduos sólidos da Região Metropolitana de Belém a não ser, por ora, o Aterro Sanitário de Marituba, cuja continuidade de funcionamento haverá de observar as regras do licenciamento, além de outras medidas que serão rigidamente fiscalizadas, seja pelo órgão licenciador fiscalizador (SEMAS), seja pelo Ministério Público”, escreveu.
Considerações sobre o processo
Na decisão, o desembargador Luiz Neto, antes de adentrar no mérito do pedido, faz algumas considerações sobre o processo em questão, com o objetivo de que o jurisdicionado não venha a ter uma equivocada percepção, ou se deixar levar por uma narrativa equivocada da realidade processual.
O relator aponta que “a questão da deposição do lixo na Região Metropolitana de Belém, notadamente envolvendo os municípios de Ananindeua, Belém, e Marituba, sempre foi – e continua sendo ao visto – um problema crônico, sendo, num determinado momento, todo resíduo sólido (ou lixo e não lixo (recicláveis), lançado a céu aberto no tristemente famoso Lixão do Aurá, com todas as perversas e nefastas consequências ambientais decorrentes de tal prática”.
O desembargador explica que “isto se deu até o ano de 2015, aproximadamente, quando foi licenciado por quem de direito, o atual aterro sanitário de Marituba, com a proposta de adequação da deposição de lixo aos ditames legislativos (Lei nº 12.305/2010 e suas sucessivas prorrogações do prazo de encerramentos dos ditos lixões)”
“Instados com esta realidade, os municípios firmaram Termo de Ajustamento de Conduta em 03.04.2013 para deixar de depor lixo no Aurá, com período de transição, que foi até julho/2015. Por consequência, a deposição passou a ser feita no Aterro de Marituba, repita-se, único local disponível após o Lixão do Aurá, com estrutura, licenciamento, prazo, etc., etc., para recebimento dos resíduos sólidos dos 03 municípios referidos”.
Continua a explicar que “problemas, a posteriori, surgiram e houve, então, a vinda dos atores da problemática ao Judiciário, como o ponto natural de solução adequada de litígios envolvendo quaisquer jurisdicionados. A empresa, em 2019, quis fechar o Aterro. Trabalhou-se num grande acordo para a prorrogação da deposição até 2021 quando, então, poderia haver o encerramento das atividades. Acordo este que foi objeto de árduas audiências e reuniões, intermediadas pelo Judiciário (que cumpriu o seu dever de buscar uma solução consensual do conflito – art. 3º, § 2º, do CPC).
O relator observou que “no ínterim, tivemos uma severa pandemia que ainda hoje nos traumatiza e, também, eleições municipais com a troca da chefia do Executivo dos municípios de Ananindeua, Belém e Marituba”. Além disso, o relator teve reuniões com todos os noveis prefeitos e relatou os problemas e a necessidade da busca de soluções.
Mais rodadas de negociações com a aproximação do término do prazo, e, outra vez, acordou-se em prorrogar a deposição até 31 de agosto de 2023. O desembargador Luiz Neto observa que “neste caminhar, o Judiciário, através deste relator, sempre realizou longas audiências e reuniões com todos os envolvidos. Sempre ouviu a todos com respeito, com urbanidade, e principalmente, imbuído da busca de uma solução de uma política pública que não é de responsabilidade do Poder Judiciário.
“E esta judicialização, por assim dizer, gerou este processo, que os doutrinadores chamam de processo estrutural, processo complexo, que “é aquele que tem por objeto o litígio estrutural; este,por sua vez, é pautado em um problema estrutural, cuja a característica é a existência de um estado de desconformidade estruturada, contínua e permanente, que não corresponde ao estado de coisas considerado ideal”, para utilizar a lição do Prof. Fredie Didier Jr., brilhante doutrinador e causídico que, inclusive, honra o nosso sistema justiça, labutando no presente feito, juntamente com outros grandes e brilhantes advogados públicos e privados aqui do nosso rincão, juntamente com o mister do Ministério Público do Estado do Pará”, escreveu.
O relator que explica que “na última audiência do processo, com a aquiescência expressa dos 03 municípios, integrantes da lide, o Estado do Pará chamou para si a coordenação e busca de solução para o problema metropolitano da deposição do resíduo sólido, tendo os municípios outorgado delegação para o referido ente subnacional. E, infelizmente, apesar de se ter caminhado mais um pouco, ainda há a necessidade de prorrogação da utilização do aterro de Marituba”.
Sobre o indeferimento do pedido, no dia 28 de agosto, feito pelo município de Belém, o relator pondera que o fez “por ser uma iniciativa isolada do município de Belém, sem qualquer prova acerca da capacidade de prorrogação do aterro de Marituba. Não se resolve, como disse, isoladamente, um problema de natureza metropolitana, notadamente porque, assuntos de governança interfederativa, como este, posto de forma bem cabal nas audiências, há de respeitar a prevalência do interesse comum sobre o local, de acordo com a legislação regente da matéria (art. 6º, inciso I, da Lei nº 13.089/2015)”.
Escreve o magistrado que “agora, porém, o pedido vem assinado pelos 04 entes subnacionais diretamente envolvidos na solução do problema (Estado do Pará, Municípios de Ananindeua, Belém e Marituba), o que me obriga a analisá-lo com outra perspectiva”.
O desembargador Luiz Neto afirma que fez esta digressão para que não se ache qualquer contrariedade entre esta decisão e a decisão indeferitória do pedido do município de Belém. Apenas preservei a postulação conjunta de todas as partes que estão imbricadas, a meu ver, no chamado litisconsórcio necessário unitário em uma relação jurídica substancial plurissubjetiva e incindível. E o fiz para demonstrar o hercúleo esforço do Judiciário na busca da solução de um problema cuja gênese, como demonstrado, não foi gestada no ventre do TJPA”.
TJPA