Institui a Política Nacional de Combate à Perda e ao Desperdício de Alimentos (PNCPDA); cria o Selo Doador de Alimentos; altera a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995; e revoga a Lei nº 14.016, de 23 de junho de 2020.
O Presidente da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta Lei institui a Política Nacional de Combate à Perda e ao Desperdício de Alimentos (PNCPDA), cria o Selo Doador de Alimentos, altera a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e revoga a Lei nº 14.016, de 23 de junho de 2020.
Art. 2º Fica instituída a Política Nacional de Combate à Perda e ao Desperdício de Alimentos (PNCPDA), cuja execução deverá observar o disposto nas Leis nºs 11.346, de 15 de setembro de 2006, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 12.305, de 2 de agosto de 2010.
Art. 3º Para os fins desta Lei, considera-se:
I – perda de alimentos: redução da disponibilidade de alimentos para consumo humano ao longo da cadeia de abastecimento alimentar, sobretudo nas fases de produção, pós-colheita e processamento;
II – desperdício de alimentos: perda de alimentos ocorrida ao final da cadeia alimentar, no varejo e no consumo final, em virtude de comportamentos adotados em estabelecimentos varejistas, em restaurantes e em domicílios;
III – doador de alimentos: pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que doa alimentos voluntariamente;
IV – beneficiário: receptor final, pessoa física, que consome os alimentos doados;
V – banco de alimentos: estrutura física ou logística que oferta serviços de captação ou de recepção, bem como de distribuição gratuita, de gêneros alimentícios provenientes de doações dos setores público e privado direcionados a instituições receptoras públicas ou privadas;
VI – instituição receptora sem fins lucrativos: instituição pública, instituição privada sem fins lucrativos, organização da sociedade civil ou entidade religiosa que atua como intermediária entre doadores de alimentos ou banco de alimentos e beneficiários das doações e que possui estrutura adequada de armazenamento, de preparo ou de distribuição final dos alimentos a beneficiários, nos termos de regulamento;
VII – instituição receptora com fins lucrativos: instituição privada com fins lucrativos que atua como intermediária entre doadores de alimentos ou banco de alimentos e beneficiários das doações e que possui estrutura de armazenamento, de preparo ou de distribuição final dos alimentos a beneficiários;
VIII – microcoleta: coleta de pequenas quantidades de alimentos destinados a doações, de pessoas físicas ou jurídicas.
CAPÍTULO II
DOS PRINCÍPIOS E DOS OBJETIVOS
Art. 4º São princípios da PNCPDA:
I – visão sistêmica do desperdício e da perda de alimentos, consideradas suas consequências para o meio ambiente, a cultura, a economia e a saúde pública;
II – respeito, proteção, promoção e provimento do direito humano à alimentação, em consonância com o art. 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, e com o art. 6º da Constituição Federal;
III – conscientização de produtores, de distribuidores e da população, especialmente crianças e jovens, a respeito das consequências do desperdício e da perda de alimentos para a sociedade;
IV – responsabilidade compartilhada sobre os alimentos, desde sua produção até seu consumo e descarte final;
V – cooperação entre os entes da Federação, as instituições públicas, as instituições privadas, as organizações da sociedade civil, as entidades religiosas e os demais segmentos da sociedade;
VI – educação destinada a despertar a consciência de consumo sustentável, a partir de ações concretas para conter o desperdício de alimentos;
VII – ampliação e fortalecimento dos bancos de alimentos, inclusive da Rede Brasileira de Bancos de Alimentos;
VIII – viabilização das microcoletas, por meio de soluções como aplicativos, sítios na internet e outras que aproximem diretamente aqueles que querem doar e aqueles que querem receber.
Parágrafo único. A relação entre doadores, instituições receptoras, bancos de alimentos e o poder público basear-se-á nos princípios da cooperação e da fiscalização orientadora, observado o critério de dupla visita.
Art. 5º São objetivos da PNCPDA:
I – aumentar o aproveitamento dos gêneros alimentícios disponíveis para consumo humano no território nacional;
II – mitigar o desperdício de alimentos, de forma a contribuir para a redução da insegurança alimentar;
III – promover a cultura da doação de alimentos destinada:
a) ao consumo humano, prioritariamente;
b) ao consumo animal;
c) à utilização em compostagem ou à produção de biomassa para geração de energia, se impróprios para o consumo humano e animal;
IV – incentivar os estabelecimentos comerciais que atuem com alimentos a fomentar a educação e a conscientização para combate ao desperdício, nas próprias instituições ou por meio de apoio a projetos educativos na área.
CAPÍTULO III
DOS INSTRUMENTOS
Art. 6º O poder público federal é autorizado a estabelecer programas e parcerias com Estados, Distrito Federal, Municípios, instituições públicas, instituições privadas, organizações da sociedade civil e entidades religiosas a fim de reduzir o desperdício e a perda de alimentos no País, na forma de regulamento.
Parágrafo único. Os Estados e o Distrito Federal poderão adotar medidas locais complementares, inclusive a redução ou a isenção do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), para incentivar as doações de alimentos.
Art. 7º Os programas de combate ao desperdício e à perda de alimentos priorizarão as seguintes estratégias:
I – incentivo a pesquisas que identifiquem as formas e a dimensão do desperdício e da perda de alimentos e que desenvolvam tecnologias e boas práticas de produção e de gestão de alimentos;
II – capacitação dos responsáveis pela produção, colheita, armazenamento, transporte, beneficiamento, industrialização, comercialização, preparo e doação de alimentos;
III – difusão de informações, nos meios de comunicação, sobre a importância e os meios de combate ao desperdício e à perda de alimentos, desde a produção até o consumo, o descarte ou a compostagem;
IV – fortalecimento das ações de educação alimentar e nutricional nas atividades do ensino fundamental e médio, de modo a destacar os meios de combate e as consequências do desperdício e da perda de alimentos;
V – aproveitamento dos alimentos impróprios para consumo humano em outras atividades, como utilização em compostagem ou produção de biomassa para geração de energia;
VI – estabelecimento de incentivos fiscais, na forma da lei, a:
a) segmentos industriais que produzam máquinas e equipamentos cujo uso proporcione redução da perda no processamento e no beneficiamento de gêneros alimentícios;
b) doadores de alimentos;
c) entidades que atuem como instituições receptoras;
d) agricultores familiares e empreendedores familiares rurais, nos termos do art. 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006;
VII – estabelecimento de incentivos creditícios, na forma de regulamento, à formação ou à ampliação de bancos de alimentos, de instituições receptoras e de suas respectivas redes;
VIII – planejamento, monitoramento contínuo e avaliação de resultados de cada programa, segundo metas e indicadores preestabelecidos, e divulgação dessas informações à sociedade por meio da internet, obrigatória quando houver utilização de recursos públicos;
IX – criação de programas de apoio e incentivos para facilitar a participação de agricultores familiares e empreendedores familiares rurais, nos termos do art. 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006, no sistema de doações de alimentos, incluídos subsídios e assistência técnica.
§ 1º Os incentivos a que se refere o inciso VII do caput deste artigo serão destinados prioritariamente a Municípios nos quais o poder público tenha constatado situação de maior insegurança alimentar ou volume elevado de doação de alimentos.
§ 2º Os incentivos a que se referem os incisos VI e VII do caput deste artigo estarão sujeitos à disponibilidade orçamentária e financeira.
Art. 8º O poder público e as organizações participantes dos programas integrantes da PNCPDA farão campanhas educativas para sensibilizar e estimular a população a:
I – adquirir produtos in natura que, mesmo com imperfeições estéticas, mantenham suas propriedades nutricionais e sejam seguros para consumo;
II – adotar boas práticas de armazenamento, de preparo, de reaproveitamento e de conservação de alimentos;
III – praticar doação de alimentos.
CAPÍTULO IV
DO SELO DOADOR DE ALIMENTOS
Art. 9º Fica criado o Selo Doador de Alimentos, com o objetivo de incentivar a participação de estabelecimentos na PNCPDA.
Art. 10. O Selo Doador de Alimentos será concedido pelo Poder Executivo aos estabelecimentos que doarem alimentos, bem como aos produtores rurais, às cooperativas e às associações de produtores rurais, nos termos desta Lei.
Art. 11. O Selo Doador de Alimentos terá validade de 2 (dois) anos, após os quais a empresa deverá passar por nova avaliação para sua renovação.
Parágrafo único. Regulamento disciplinará os procedimentos de concessão, de renovação e de perda do selo.
Art. 12. O Selo Doador de Alimentos poderá ser utilizado pelo estabelecimento como lhe aprouver na promoção da sua empresa e de seus produtos.
Art. 13. O Poder Executivo federal divulgará o nome das empresas detentoras do Selo Doador de Alimentos em sítio eletrônico oficial na internet e nos seus programas e projetos de combate à fome e ao desperdício de alimentos.
CAPÍTULO V
DA DOAÇÃO DE ALIMENTOS
Art. 14. Poderão ser doados a bancos de alimentos e a instituições receptoras e diretamente aos beneficiários os alimentos embalados perecíveis e não perecíveis, dentro do prazo de validade, e os alimentos in natura ou preparados, desde que mantidas as propriedades nutricionais e a segurança para consumo humano, respeitadas as normas sanitárias vigentes.
§ 1º Os bancos de alimentos, as instituições receptoras e os estabelecimentos que realizam doações diretamente aos beneficiários deverão contar com profissional legalmente habilitado que ateste a qualidade nutricional e sanitária dos alimentos entregues, na forma de regulamento.
§ 2º Os alimentos que não apresentarem condições apropriadas ao consumo humano poderão ser destinados pelos doadores à utilização em compostagem agrícola ou à produção de biomassa para geração de energia, na forma de regulamento.
Art. 15. A doação de alimentos, nos termos desta Lei, constituirá exceção ao regime da responsabilidade objetiva disposto no art. 931 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e nos arts. 12 e 13 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).
Art. 16. O doador de alimentos e o intermediário apenas responderão civilmente por danos ocasionados pelos alimentos doados quando houver dolo, nos termos do art. 392 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).
Art. 17. A doação de alimentos, nos termos desta Lei, não configurará, em nenhuma hipótese, relação de consumo, ainda que haja finalidade de publicidade direta ou indireta.
CAPÍTULO VI
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 18. (VETADO).
Art. 19. Fica revogada a Lei nº 14.016, de 23 de junho de 2020.
Art. 20. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 30 de setembro de 2025; 204º da Independência e 137º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Carlos Henrique Baqueta Fávaro
Luiz Paulo Teixeira Ferreira
Osmar Ribeiro de Almeida Junior
Simone Nassar Tebet
Márcio Costa Macêdo
MENSAGEM Nº 1.403
DOU 1/10/2025
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos previstos no § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei nº 2.874, de 2019, que “Institui a Política Nacional de Combate à Perda e ao Desperdício de Alimentos (PNCPDA); cria o Selo Doador de Alimentos; altera a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995; e revoga a Lei nº 14.016, de 23 de junho de 2020.”.
Ouvidos, o Ministério da Fazenda, o Ministério do Planejamento e Orçamento, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, a Secretaria-Geral da Presidência da República e a Advocacia-Geral da União manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo do Projeto de Lei:
Art. 18. do Projeto de Lei
“Art. 18. A Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, passa a vigorar com as seguintes alterações:
‘Art. 13. ……………………………….
……………………………………………
§ 4º Nas doações de alimentos dentro do prazo de validade e de alimentos in natura em condições de consumo seguro na forma das normas sanitárias vigentes, o limite da dedução prevista no inciso III do § 2º deste artigo será de 5% (cinco por cento) do lucro operacional da pessoa jurídica, antes de computada a sua dedução.
§ 5º As pessoas jurídicas que doarem alimentos e fizerem jus à dedução prevista no inciso III do § 2º deste artigo são obrigadas a prestar informações às autoridades fiscais e sanitárias sobre volume, espécie de alimento, valor, bancos de alimentos, instituições receptoras e beneficiários das doações, entre outras, na forma de regulamento.
§ 6º As informações referidas no § 5º deste artigo comporão sistema de registro de informações estatísticas e geográficas sobre doações de alimentos.’ (NR)
‘Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, deduzida das devoluções, das vendas canceladas, das doações de alimentos e dos descontos incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995.
……………………………………………
§ 5º Serão deduzidas da base de cálculo a que se refere o caput deste artigo as doações de alimentos dentro do prazo de validade e de alimentos in natura em condições de consumo seguro na forma das normas sanitárias vigentes, até o limite de 5% (cinco por cento) do lucro operacional da pessoa jurídica, antes de computada a sua dedução.
§ 6º As pessoas jurídicas que doarem alimentos e fizerem jus à dedução prevista no § 5º deste artigo são obrigadas a prestar informações às autoridades fiscais e sanitárias sobre volume, espécie de alimento, valor, bancos de alimentos, instituições receptoras e beneficiários das doações, entre outras, na forma de regulamento.
§ 7º As informações referidas no § 6º deste artigo comporão sistema de registro de informações estatísticas e geográficas sobre doações de alimentos.’ (NR).”
Razões do veto
“A proposição legislativa é inconstitucional e contraria o interesse público, ao instituir benefício tributário que acarreta renúncia de receita sem a apresentação de estimativa de impacto orçamentário e financeiro, sem a demonstração de consideração da renúncia na Lei Orçamentária ou sem a apresentação de medida de compensação, além de não haver previsão de limitação temporal de, no máximo, cinco anos de vigência, em descumprimento ao disposto no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, no art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal, e nos art. 129 e art. 139 da Lei nº 15.080, de 30 de dezembro de 2024 – Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2025.”.
Essas, Senhor Presidente, são as razões que me conduziram a vetar o dispositivo mencionado do Projeto de Lei em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.