O Sistema Carcerário Brasileiro, um Litígio Estrutural

Rayane Ayres Lima – Bacharela em Direito pela Universidade de Brasília; Licenciada em Letras pela Universidade de Brasília.

 

RESUMO: O Objetivo central desse artigo é compreender o sistema carcerário brasileiro sob a perspectiva dos litígios estruturais. Busca-se demonstrar a relação entre Estado e Direitos Sociais confirmando a premissa de que cabe ao Estado a garantia desses direitos; em seguida, serão apresentados os conceitos de litígio estrutural, a fim de que se demonstre que o sistema carcerário brasileiro representa hoje a violação sistêmica e generalizada de direitos das pessoas presas, o que o torna um litígio estrutural, justificando a intervenção estatal, na estrutura das instituições violadoras, com o intuito de cessar as violações e garantir a eficácia das normas constitucionais.

PALAVRAS-CHAVE: litígios estruturais; litígios complexos; efetividade de direitos sociais; sistema carcerário.

SUMÁRIO: Introdução 1. A Constituição de 88, a efetividade dos dirietos fundamentais e os litígios estruturais. 2. A experiência norte americana. 3. O sistema carcerário enquanto uma violação sistêmica das garantias constitucionais e normas de direitos humanos. 4. A lógica estrutural como possibilidade de atuação do judiciário em casos onde instituições estão violando sistemicamente direitos fundamentais dos detentos. Considerações Finais. Referências.

 

Introdução 

Como indicado pelo título, esse trabalho insere-se na discussão acerca dos litígios estruturais, que são aqui compreendidos como a violação sistêmica de direitos fundamentais causados pela própria estrutura de funcionamento de uma instituição. Trata-se de relevante discussão vez que a Constituição Brasileira, maior símbolo do processo de redemocratização, ampliou direitos sociais e garantias individuais, mas a efetividade desses direitos, bem como a atuação do Estado na garantia dessa efetividade ainda é amplamente discutida.

Dentro do rol dos direitos fundamentais encontram-se os direitos relacionados às pessoas presas, a efetividade desses direitos sempre foi questionada dentro do ambiente jurídico-político. Hoje, essa discussão ganha nuances ainda mais relevantes diante dos níveis alarmantes de violação que são diariamente perpetuadas nas cadeias brasileiras.

Nesse artigo, será discutido a violação dos direitos fundamentais das pessoas presas no Brasil. Busca-se compreender se o sistema carcerário brasileiro tem resultado em litígios estruturais. O grande questionamento que decorre do reconhecimento desse modelo como litígio estrutural é como deve se dar a atuação do Estado diante desse cenário. O intuito é apresentar as decisões estruturantes como uma via para cessar a violação sistêmica de direitos fundamentais nas cadeias brasileiras.

 

1. A Constituição de 88, a efetividade dos direitos fundamentais e os litígios estruturais. 

Percebe-se no texto constitucional de 88 o aumento na juridificação garantidora das liberdades, a constitucionalização das relações privadas, e a promoção da ideia de justiça social a ser assegurada pelo Estado através de políticas que garantam a igualdade formal. Essas são características do chamado Estado de Bem-Estar Social, modelo estatal paradigmático(1) adotado pela Constituição de 1988. Othon Lopes destaca que:

No Estado de Bem-Estar Social, a política social selecionou situações de debilidades extremas para absorvê-las, deixando intactas as relações de propriedade, receitas e dependências. Regulações e prestações estatais dirigiam-se para a consecução de um equilíbrio social por meio de compensações, mas também para a correção de externalidades coletivamente sensíveis, como meio ambiente, cidades, políticas sanitárias etc.(2)

Sarlet afirma a existência de três características consensualmente atribuídas à Constituição de 1988: seu caráter analítico, em razão do seu grande número de dispositivos legais; seu pluralismo, uma vez que em seu texto final há um acolhimento e tentativa de conciliar posições e reivindicações conflitantes entre si, fruto das diversas forças políticas envolvidas na Constituinte; e por fim, seu cunho programático e dirigente com várias normas orientadoras a serem concretizadas pelo poder público. (3)

Há que se observar, portanto, que no modelo de Estado adotado pelo constituinte originário exige-se do Estado uma maior atuação a fim de que se garanta o equilíbrio social. Nesse sentido, o artigo 3º da Constituição Federal de 88 é claro ao estabelecer como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e da marginalização, bem como a redução das desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de qualquer origem. Uma leitura sistemática da Constituição relaciona esses objetivos a real eficácia dos direitos fundamentais. Dentro da lógica do Estado de Bem-Estar Social, esses objetivos, bem como a eficácia dos direitos fundamentais, devem ser assegurados pelo Estado, sendo esse, portanto, um dever estatal.

Esse artigo volta-se pra análise da violação de direitos fundamentais de pessoas presas, nesse sentido, é importante ressaltar que além das previsões constitucionais desses direitos, há também diversas previsões de tratados dos quais o Brasil é signatário que tem por objetivo a proteção da dignidade dos detentos. Há, portanto, um dever estatal em garantir a eficácia prática desses direitos. Após a promulgação da Constituição de 88 surgiu no cenário jurídico e político um grande questionamento: uma vez que o ordenamento jurídico optou por vincular a Administração Pública, e, portanto o Estado, à efetivação dos direitos sociais, como se daria a exigibilidade dos direitos fundamentais que demandassem uma prestação positiva do Estado na busca do “bem-estar social”, como é o caso do rol dos direitos sociais?

Inicialmente, a maior parte da doutrina, aqui representada por José Afonso da Silva(4), lhes atribuiu caráter meramente programático, ou seja, os entendia como objetivos a serem perseguidos pelo Estado, sem ser necessário que se especificasse o modo como seriam alcançados. Sob a alegação de baixa densidade normativa, defendia-se a impossibilidade de exigibilidade pela via jurisdicional. Portanto, a eficácia desses direitos dependeria da interposição do legislador. Essa interpretação mostrou-se extremamente problemática a longo prazo, pois prejudicou a tutela jurisdicional dos direitos sociais(5), uma vez que os Tribunais negavam-lhe qualquer eficácia, deixando sua efetividade à mercê da vontade da Administração Pública.

Percebendo que a interpretação estava levando a não efetivação da Constituição Federal, a doutrina majoritária(6) e a jurisprudência mudaram seu entendimento conferindo aplicabilidade direta e eficácia imediata aos diretos fundamentais, de forma que a exigibilidade pela via judicial passou a ser possível. Observa-se no cenário nacional e internacional uma mudança de interpretação, no entanto, na prática, muitos dos debates encontram-se atrasados, vez que ainda se discute “se” os direitos sociais podem ser efetivados judicialmente. Ora, como já demonstrado, tais direitos são umas da razão de ser do Estado brasileiro e, ainda que seja possível tecer críticas ao modelo programático adotado pela Constituição, tais críticas não mudam o fato de que esses direitos tem aplicabilidade direta, eficácia imediata e são passíveis de exigibilidade no judiciário.

Depois que a doutrina e a jurisprudência passaram a entender pela exigibilidade judicial dos direitos fundamentais, observou-se o aumento em um determinado tipo de demanda. O judiciário passou a se deparar com repetitivas situações em que a violação desses direitos se dava de forma sistemática, massiva e generalizada sendo muitas vezes fruto de uma ação ou omissão do próprio Poder Público.

Nesse sentido, há uma importante conceituação a ser analisada: a de litígios estruturais. Aqui, será utilizado o conceito de Vitorelli que entende o litígio estrutural como sendo:
um litígio irradiado(7) no qual a violação surge em decorrência do funcionamento de uma estrutura burocrática, pública ou privada, e, em virtude das características contextuais em que ocorre, sua solução exige a reestruturação do funcionamento da estrutura.(8)

Para que se compreenda os litígios estruturais, é necessário primeiramente observar as principais características e a forma como se dá a dinâmica da violação sistêmica de direitos. Nesse sentido, Ferraro(9) expõe como principais características dessa violação: (i) o fato de serem dinâmicas e estarem em curso; (ii) nesses casos o infrator põe-se como uma abstração e as partes afetadas são grupos; (iii) o foco da preocupação não são condutas específicas que inobservam direitos, mas o próprio contexto em que acontecem; (iv) não ganha relevância a averiguação de intenções e culpa para configurar essas espécies de violação dos direitos; (v) existe uma relação, que se prolonga no tempo, de dependência ou compulsoriedade entre as vítimas e as instituições; (vi) a causalidade é complexa.

Nos litígios estruturais as violações são frutos de ações/omissões repetitivas e enraizadas em uma determinada estrutura burocrática. Dessa forma, elas não podem ser encaradas de forma pontual, pois são dinâmicas e estão em curso. Essa característica da violação impede que o tratamento de litígios estruturais se dê sob a perspectiva de acontecimentos passados, isso inviabilizaria a percepção de elementos necessários para a concretização da reestruturação da instituição que está violando direitos(10).

O segundo ponto a ser observado é que, devido à violação ser sistêmica e estar em curso, perdurando no tempo, é quase impossível ponderar cada sujeito dessa relação. Essa lógica se aplica tanto aos sujeitos que cometem a infração quanto às vítimas. Uma vez que os direitos não são desrespeitados por condutas isoladas, o infrator tende a abstratizar-se(11). Por outro lado, a violação de direitos não atinge apenas indivíduos específicos, mas sim um grupo diverso.

É possível observar também que, como há a abstratização da figura do agente do ato ilícito, a identificação desse tipo de litígio não se faz com base na procura de intenções, de condutas individualizadas ou motivações, mas no resultado de um conjunto de fatores(12). O foco da preocupação não são condutas específicas que inobservam direitos, até porque muitas vezes os atos ou omissões em si sequer configuram um ilícito com consequências específicas previstas no ordenamento jurídico. Para que seja possível garanti-los é necessário que o foco seja no dano em si.

Outra questão importante a ser constatada está relacionada às causas dos litígios estruturais. A análise macro que esses litígios exige que se demonstre que existem diversas causas para um problema estrutural já que a violação em si é resultado de um conjunto de práticas dinâmicas institucionais. Uma consequência lógica do fato das causas serem diversas é que, da mesma forma, as soluções possíveis serão múltiplas.

 

2. A experiência Norte-Americana

A fim de que se compreenda o surgimento dos chamados litígios estruturais será explicitado nesse item um dos primeiros e mais importantes casos, referente a esse tipo de litígio, ocorrido nos Estados Unidos, o caso Brown v. Board of Educations of Topeka. Logo em seguida, no intuito de que se possa fazer uma análise comparativa com o sistema penitenciário brasileiro, será apresentado como os norte americanos lidaram com o litígio estrutural referente a seu sistema carcerário. Passa-se então a análise do primeiro caso.

Um dos primeiros litígios estruturais, tratado como tal, foi o caso norte-americano Brown v. Board of Educations of Topeka, julgado em 1954 pela Suprema Corte dos Estados Unidos. Esse foi o nome dado ao conjunto de cinco casos que tratavam da segregação racial no sistema de escolas públicas americanas. Os casos possuíam características próprias e aconteceram em Distritos diferentes, mas tinham o mesmo problema.

Os juízes de primeira instância decidiram os casos contra a comunidade negra, o que fez com que Thrugood Marshall e a NAACP Legal Defense and Education Fund apelassem para a Suprema Corte. Marshall argumentava que estava havendo uma violação sistêmica da Décima Quarta Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que estabelece a proteção igual a todos os cidadãos, uma vez que, ainda que na teoria os dispositivos para a aprendizagem nas escolas separadas pelo critério racial fossem iguais, a segregação racial nas escolas públicas era inerentemente desigual. Tal argumento era contrário ao precedente do princípio do “separados mais iguais”.

Após muito embate a Corte declarou de forma unânime a decisão pela inconstitucionalidade do sistema de segregação racial nas escolas públicas. No entanto, após ter se passado um ano do proferimento da decisão, percebeu-se que a declaração de inconstitucionalidade não foi suficiente para alcançar os resultados almejados. Foi feita uma reanalise do caso onde se delegou aos juízes locais a missão de realizar as mudanças estruturais necessárias. Para tanto, os juízes começaram a intervir da designação de alunos para cada escola, na contratação de professores, no ensino de idiomas, nas provas e no próprio currículo escolar. Além disso, escolhiam os locais onde as escolas seriam construídas e instituíram impostos para custeá-las(13).

As técnicas usadas no julgamento, conhecidas como structural injuctions, ordens judiciais de fazer ou não fazer, deram início às structural reforms, que é “um modelo de adjudicação(14) no qual o Poder Judiciário determina que autoridades políticas ou administrativas elaborem políticas públicas voltadas à cessação de violação sistêmica a direitos fundamentais.”

Após a década de 60, as structural injuctions passaram a ser utilizadas em outros casos de reformas estruturais, como a reforma de prisões, instituições psiquiátricas, departamentos de polícia e sistemas públicos de habitação. Owen Fiss afirma que:

as medidas estruturantes tiveram um alcance tão amplo quanto os órgãos existentes no estado burocrático moderno. (15)

(…) as lições tiradas dos casos de dessegregação escolar passaram a ser aplicadas em outros contextos: na proteção da segurança pessoal em face de abuso policial, na garantia humanitária na prisão e hospitais psiquiátricos, na proteção do devido processo legal na administração pública e na uniformização dos gastos com os sistemas educacionais estaduais(16).

Na década de 80 as ações estruturais americanas alcançaram um patamar sem precedentes. A fim de garantir as structural reforms, os juízes nomearam interventores para acompanhar a correção da instituição sob intervenção, organizaram comitês populares para supervisionar a implementação das medidas delineadas, determinaram, alterações substanciais nas condições estruturais de instituições públicas, interferiram em seus quadros de funcionários e chegaram ao ponto de determinar a órgãos governamentais que aumentassem os impostos para suprir os custos das medidas estruturais(17).

O caso do sistema prisional é marcante por demonstrar as dimensões alcançadas pela atuação do judiciário(18). Além de declarar a inconstitucionalidade dos sistemas prisionais de 41 estados norte-americanos, houve a nomeação de interventores na administração de presídios, controlou minúcias do funcionamento dessas instituições, através da implementação de medidas que cobriam aspectos diversos como as instalações, saneamento, comida, vestuário… Proferiu-se ameaças de prender funcionários públicos que deixassem de atender decisões(19) soltaram presos encarcerados em presídios superlotados(20) e ordenaram a contratação de médicos, enfermeiros e nutricionistas para garantia do direito à saúde dos presos(21).

Toda essa “intervenção” por parte do judiciário passou a ser alvo de severas críticas, sendo considerada uma interferência excessiva à organização interna da Administração Pública e graves exemplos de violação do princípio da separação de poderes. Os juristas destacavam a falta de legitimidade democrática e a falta de expertise do judiciário para exercer esse tipo de atuação. Chamavam atenção para os altos gastos que envolviam os litígios estruturais. Além disso, afirmavam que as intervenções do judiciário representavam uma subversão do seu papel nas democracias contemporâneas(22). Uma das reações mais conservadoras foi por parte do Congresso norte-americano que:

acabou estabelecendo severas restrições às injuctions. A Prision Litigation Reform Act (PLRA), lei promulgada em 1996, impôs significativos limites aos poderes jurisdicionais e cerceou a aplicação das injuctions no sistema prisional norteamericano. A partir dessa lei apenas em último caso as cortes poderiam ordenar a liberação de presos encarcerados em presídios superlotados e adotar remédios estruturais mais invasivos. (23)

Esse cenário fez com que houvesse um declínio na concessão de medidas estruturantes a partir da década de 90. Mas mesmo após décadas de críticas, esse ainda segue sendo um modelo de adjudicação comum nos Estados Unidos.

 

3. O sistema carcerário enquanto uma violação sistêmica das garantias constitucionais e normas de direitos humanos

Hoje, o ordenamento jurídico brasileiro possui diversas garantias legais que asseguram aos presos seus direitos enquanto cumprem suas penas. A Constituição Federal e a Lei de Execução Penal estabelecem diversos dispositivos que tem por objetivo proteger as garantias das pessoas presas. Além das normas nacionais, o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que também tem como um de seus objetivos a observação da dignidade da pessoa humana, independente desta estar presa ou não.

O sistema carcerário brasileiro é evidente resultado de sucateamento, as prisões enfrentam superlotação e os detentos não estão tendo suas condições de saúde, segurança físico psicológica, alimentação e educação assegurados.

De acordo com o IBCCrim, o déficit de vagas do sistema prisional brasileiro era de 250.000 vagas no final do ano de 2016, com uma taxa de ocupação de 1,9 presos por vaga. Isso se deve ao salto ocorrido desde os anos 1990 de quase 100.000 para 622.000 presos até os dias atuais, sem que o sistema prisional tivesse acompanhado tal crescimento. Seria preciso quase que dobrar a capacidade atual de vagas para atender ao total da demanda prisional e praticamente triplicar o número de vagas disponíveis, na hipótese de cumprimento de todos os mandados de prisão em aberto até o final do ano de 2016 – 500 mil, segundo o Banco Nacional de Mandados de Prisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).(24)

Todo esse descaso tem causado uma violação sistêmica de direitos fundamentais dos detentos, que são, muitos deles, baseados em um dos fundamentos da Constituição de 1988, a dignidade da pessoa humana. A violação de tal princípio nas instituições carcerárias tem sido de tal nível que a situação a qual os presos são expostos é tão degradante e contínua que pode ser chamado de tortura.

Nesse sentido, a Constituição veda que alguém seja submetido a tortura e tratamento desumano e degradante, sendo um direito e garantia individual, previsto no artigo 5º da norma constitucional, não ser tratado com distinção de nenhuma natureza. Portanto, ao preso deve ser assegurado sua integridade física, moral sendo respeitada sua dignidade enquanto ser humano. José Afonso da Silva afirma:

Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. “Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer ideia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana”. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos exigência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz.(25)

Como visto, para que um litígio seja considerado como litígio estrutural, é necessário que a dinâmica da violação sistêmica seja (i) dinâmicas e estar em curso; (ii) sendo o infrator uma abstração e as partes afetadas grupos; (iii) o foco da preocupação não são condutas específicas que inobservam direitos, mas o próprio contexto em que acontecem; (iv) não ganha relevância a averiguação de intenções e culpa para configurar essas espécies de violação dos direitos; (v) existe uma relação, que se prolonga no tempo, de dependência ou compulsoriedade entre as vítimas e as instituições; (vi) a causalidade é complexa.

O caso do sistema carcerário brasileiro preenche todos os requisitos vez que as violações de direitos fundamentais dos presos são dinâmicas e estão em curso. Não há como personificar ou individualizar apenas um infrator, as violações são cometidas desde os agentes penitenciários, passando pelos administradores das prisões chegando até os legisladores que por omissão não fazem leis que protejam de fato os direitos violados. Sempre se coloca a culpa no Poder Público, havendo, portanto, uma abstração da figura do infrator. Há também aqui um grupo específico que é afetado, a população carcerária brasileira.

Não há como dizer que há apenas uma conduta específica que causa tantas violações, todo o contexto do sistema carcerário brasileiro é palco das violações. Não importa também a averiguação de culpa para que se identifique a violação sistêmica dos direitos dos detentos, vez que ocorrem no país inteiro de forma sistêmica, é melhor cessar a violação do que fazer todo o trabalho de averiguação de culpa. Há evidente dependência entre os presos e as instituições carcerárias onde cumprem suas penas. Por fim, é evidente que a causalidade das violações é complexa, não basta dizer que é apenas um problema de gestão ou resultado de apenas uma lei ou não observação de outra lei.

A compreensão das principais características da violação sistêmica de direitos fundamentais possibilita que se compreenda as razões de ser do próprio litígio estrutural. César Rodríguez-Garavioti assinala(26) que o litígio estrutural é caracterizado por: (i) afetar um grande número de pessoas que alegam violação de seus direitos fundamentais; (ii) envolver vários agentes estatais, que figuram como réus da ação por serem responsáveis por falhas sistemáticas; e (iii) abranger ordens de execuções complexas, que obrigam os administradores a implementar políticas para proteger os direitos de toda população afetada. Ao analisar o caso do sistema carcerário brasileiro é perceptível todas essas características, sendo, portanto, um litígio estrutural.

 

4. A lógica estrutural como possibilidade de atuação do judiciário em casos onde instituições estão violando sistemicamente direitos fundamentais dos detentos.

Os litígios estruturais, por suas características, requerem tratamento diferenciado, tanto por parte da administração pública quanto por parte do judiciário.

No artigo “O descumprimento da lei penal no Brasil pelo próprio estado”, as autoras reconhecem a violação sistêmica que ocorre nas prisões brasileiras e oferecem como medidas:

– a redução do número de crimes que o legislador é incapaz de fazer (e faz o contrário);

– a substituição das penas que os juízes muitas vezes não fazem, além da difícil implementação das audiências de custódia (por não prioritário na política judiciária);

– a supervisão não realizada pelo Ministério Público da pena de prisão;

– a ação ilegal da polícia que não tem controle externo (Ministério Público) ou interno (Corregedorias),

– a necessidade de concurso e contratação de defensores públicos em número suficiente, entre outros profissionais que não aqueles que atuam estritamente na área jurídica, como peritos e assistentes sociais.(27)

Destacam que, no entanto, essas não são medidas fáceis de serem adotadas e que não produzem reflexos imediatos, mas esclarecem que não há uma solução mágica e que são essas as medidas necessárias para que sejam possíveis mudanças a nível nacional.

Uma técnica relativamente recente que tem sido utilizada no cenário nacional para tratar dos litígios estruturais é o: reconhecimento do Estado de Coisas Inconstitucional. Aos moldes da declaração de inconstitucionalidade do sistema prisional Norte-Americano, bem como diante do entendimento de que esse tipo de litígio está relacionado a omissões estruturais que acarretam na violação de direitos fundamentais, o Supremo Tribunal Federal vem reconhecendo um “estado de coisa inconstitucional” e além do tradicional controle de constitucionalidade vem promovendo um controle de efetividade das normas.

O primeiro julgado brasileiro que adotou esse entendimento foi a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347 que, na esteira da jurisprudência comparada, decretou o estado de inconstitucionalidade dos presídios brasileiros. Pode-se compreender o estado de coisas inconstitucional como:

a técnica de decisão por meio da qual cortes e juízes constitucionais, quando rigorosamente identificam um quadro de violação massiva e sistemática de direitos fundamentais decorrente de falhas estruturais do Estado, declaram a absoluta contradição entre os comandos normativos constitucionais e a realidade social, e expedem ordens estruturais rígidas a instar um amplo conjunto de órgãos e autoridades a formularem e implementarem políticas públicas voltadas à superação dessa realidade inconstitucional. O ECI anda lado a lado com as sentenças estruturais.(28)

Andrade Silva(29) ao analisar a ADPF nº 347 alega que houve uma excessiva judicialização por parte do STF vez que a Corte não só declarou a violação estrutural setorial que acarretou graves violações a direitos fundamentais, mas também determinou ao administrador em caráter mandamental, a adoção de medidas com repercussão direta no orçamento. Segundo o autor esse tipo de atuação do judiciário pode, a longo prazo, “desestruturar o próprio sistema de consagração de direitos, transformando o legítimo discurso dos direitos fundamentais em hipertrofia da jurisdição constitucional.

O que se busca defender nesse artigo é a implementação da tutela jurisdicional estrutural como uma possibilidade de atuação, que tem por intuito cessar a violação sistêmicas dos direitos fundamentais de pessoas presas. A lógica das decisões estruturais pode ser aplicada tanto em instituições específicas quanto de uma forma mais abrangente, ou seja, o judiciário pode atuar em um estado inteiro ou até de forma nacional. Obviamente, que o tamanho da atuação será diretamente proporcional a dificuldade para garantir o cumprimento das decisões estruturantes.

A implementação da tutela jurisdicional estrutural se mostra como um grande desafio por requerer uma mudança no pensamento jurídico, com a superação de diversos paradigmas a muito consolidados. Além disso, requer a compreensão de que haverá custos econômicos, culturais e institucionais. Requer também um grande diálogo institucional para compreender que as funções do Estado são repartidas com o intuito maior de proteção e efetivação dos direitos humanos e da sociedade.

Tal implementação recebe, principalmente, as seguintes críticas: a afronta ao princípio da separação de poderes, a falta de legitimidade democrática, a falta de capacidade institucional e os efeitos antidemocráticos. Com relação à separação de poderes o problema é que surja um Judiciário autoritário em auto impositor aos outros poderes; a falta de legitimidade democrática vem do medo de que decisões tão sensíveis à sociedade sejam tomadas por um poder com menos identificação popular; a falta de capacidade institucional seria resultado de limitações relacionadas ao tempo, quantidade de informações e expertise do juiz; e os efeitos antidemocráticos também seriam fruto de um judiciário que impõe sua decisão.

Aqui, evidencia-se essas críticas, antes de abordar os principais benefícios da adoção de uma lógica estrutural de resolução do litígio, para afirmar que o Judiciário pode atuar nesses litígios, vez que toda essa argumentação contrária torna-se obsoleta se houver um comprometimento com o diálogo. A legitimidade do Judiciário não é fruto de um princípio majoritário, mas sim funda-se no próprio processo decisório. A decisão estrutural deve ser, a priori, fruto da máxima interação entre o Poder Judiciário, a instituição público/privada que está violando sistematicamente um direito fundamental e a sociedade. Prioriza-se então um modelo deliberativo para resolução do conflito.

É necessário, no entanto que depois da aplicação prioritária do modelo deliberativo, as partes compreendam que a falta de cooperação, ou medidas urgentes, exigirá do Judiciário uma postura mais dura aos moldes de modelo impositivo de ordens e sanções em caso de descumprimento. A adoção desse modelo, após a tentativa das técnicas deliberativas, não pode ser encarado como interferência do judiciário ou perda da legitimidade democrática. O dever constitucional que deve ser observado é a defesa do direito fundamental

Diante do entendimento de que litígios estruturais precisam de um tratamento diferenciado por parte do judiciário, cabe por fim esclarecer o porquê realizar tão grande sacrifício social e institucional. Quanto aos impactos de litígios estruturais Rodríguez-Garavioto e Diana Franco(30) destacam quatro tipos de efeitos causados pelas decisões estruturais: i. efeitos diretos instrumentais – relacionados à capacidade da sentença de moldar as condutas das partes e ser efetiva; ii. efeitos diretos simbólicos – que geram modificação da percepção pública sobre o problema de vinculação de direitos; iii. efeitos indiretos instrumentais; iv. e efeitos indiretos simbólicos. Sendo esses dois últimos todos os efeitos derivados da sentença que afetam não somente as partes do processo, mas também o resto da sociedade.

Litígios estruturais influenciam a sociedade de diversas maneiras. Obviamente que os efeitos diretos causados pela efetividade de decisões que garantam direitos fundamentais, bem como que possibilitam uma mudança de mentalidade da sociedade são efeitos em muito almejados para uma digna evolução social. Não se pode, no entanto, deixar de lado a importância dos efeitos indiretos, pois eles também são fundamentais nesse processo, vez que alteram a percepção sobre aquele direito de forma que, ainda que não se traduzam instantaneamente na mudança almejada, modificam o jogo no sentido de redefinirem suas regras através dos grupos sociais envolvidos.

Litígios estruturais promovem a modificação da percepção pública sobre a violação de direitos, incentivam que o tema seja pautado na agenda pública, promovem mobilização social, bem como a mudança de percepção relacionada à urgência e gravidade de problemas de violação estrutural e proporcionam importante superação paradigmática para institutos jurídicos e políticos. Se tratados adequadamente, esses litígios promovem o amadurecimento da sociedade através do equilíbrio das situações de poder mediante transformação gradual do aparato estatal que se põe no seu papel constitucional de garantidor de direitos fundamentais.

Percebe-se que de fato a atuação do STF aos moldes da ADPF nº 347, que reconhece o estado de inconstitucionalidade e já adota medidas de caráter mandamental não se adéqua ao que vem sendo defendido até aqui, uma vez que deixa de fora do debate aqueles que de fato estão tendo seus direitos mitigados e intervém diretamente na administração pública sem dar a ela a oportunidade de um diálogo institucional que possibilite a correção da violação. Existe uma subversão da democracia nesse tipo de atuação.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema carcerário brasileiro se configura enquanto litígio estrutural vez que promove de forma sistêmica a violação dos direitos sociais trabalhistas garantidos na Constituição enquanto direitos fundamentais. Essa violação surge em decorrência da própria estruturação de funcionamento das prisões, bem como de falhas que vão além das instituições prisionais em si, há também falhas por parte do legislativo e do judiciário quando da aplicação da lei.
Percebe-se que os direitos previstos na Constituição e na Lei de Execução Penal estão sendo violados de forma dinâmica. O infrator desses direitos não é um gestor específico, vez que a violação se dá em razão da própria estrutura de funcionamento, há uma abstração da figura do infrator outra consequência gerada por essa estrutura é que ela vai atingir todos os presos e não apenas alguns indivíduos.

Para a resolução desses litígios o foco da preocupação não são condutas específicas que inobservam direitos, mas o próprio contexto em que acontecem. Não ganha relevância a averiguação de intenções e culpa, detentos estão tendo seus diretos violados independente de essa ser a intenção ou não do sistema prisional; Vez que trata-se da relação que surge entre o Estado e a pessoa presa, claramente existe uma relação, que se prolonga no tempo, de dependência entre os presos e o Estado. Por fim, como demonstrado anteriormente diante de todo o cenário exposto, a causalidade da violação dos diretos é complexa.

O sistema prisional brasileiro preenche todos os requisitos para configurar-se como um litígio estrutural. Enquanto litígio estrutural, a principal forma de cessar as violações é a reestruturação do funcionamento da estrutura das instituições que estão violando direitos. Nesse momento, pode surgir o questionamento sobre qual seria a legitimidade do Judiciário para interferir diretamente na estrutura de funcionamento de prisões.

A resposta para esse questionamento encontra-se na primeira discussão proposta nesse artigo. A Constituição Federal de 1988 adotou o Estado de Bem-Estar Social como modelo de Estado, tendo o poder constituinte estabelecido normas orientadoras a serem concretizadas pelo poder público. Dentre essas normas, encontram-se os direitos fundamentais que hoje possuem aplicabilidade direta, eficácia imediata e são passíveis de exigibilidade no judiciário. Assegurar esses direitos não é uma discricionariedade do Estado, mas sim um dever constitucional. Nesse sentido, o Judiciário não só tem legitimidade para intervir como também tem o dever de fazê-lo.

A tratativa de litígios estruturais é realmente uma questão sensível, pois envolve problemas policêntricos, imbricação de interesses, causalidade complexa e embate entre instituições que compõe o Estado, se a tudo isso soma-se todo preconceito que há na defesa dos direitos das pessoas que estão presas, compreende-se a dificuldade que é tratar dos litígios estruturais relacionados ao sistema carcerário.

A discussão desenvolvida aqui tem como foco central o reconhecimento de que é preciso agir. A Constituição foi promulgada há mais de trinta anos, a defesa de direitos fundamentais precisa ser institucionalizada pelo Estado no mínimo na mesma proporção das violações que por ele são causadas. A omissão na efetivação desses direitos impõe ao Judiciário um dever de controle efetivo diante do papel que lhe foi constitucionalmente garantido: o de proteção da Constituição como principal instrumento de defesa social que ganha vida na justa medida da concretização das suas normas.

Não há como se falar em Estado Democrático de Direito sem ampla defesa das minorias, ainda que no caso essas estejam sendo assim chamadas não por questões numéricas, mas sim por estarem sendo sistemática privadas de seus direitos com intuito de garantir a manutenção de privilégios da, aí sim, minoria numérica, que se torna maioria no processo de tomada de decisão política em razão da concentração de poder que tem nas mãos.

O preço da omissão do Judiciário é a não efetivação da Constituição. Não há sociedade justa sem dignidade da pessoa humana e não há outro caminho para concretização dessa dignidade que não seja pela garantia dos direitos fundamentais. Espera-se que sempre haja a superação dos paradigmas que não se prestem ao fortalecimento de uma sociedade plural, fraterna e democrática.

 

THE BRAZILIAN PRISON SYSTEM, A STRUCTURAL LITIGATION.
ABSTRACT: The central objective of this article is to comprehend the Brazilian carcass system with the perspective of structural litigation. Search to demonstrate the relationship between State and Directors Social confirming the premise that cabeo the State guarantees these rights; on the other hand, there will be presenters of the construits of an litigation litigation, and it will be demonstrated that the Brazilian carcass will represent a systematic and generalized violation of the laws of those persons, or that it will issue an arbitral tribunal, justifying and intervening the institutions of violators, with the intuition of cessation of violations and guarantee the enforcement of constitutional norms.
KEYWORDS: structural litigation; complex litigation; effectiveness of social rights; carcerar system.

 

REFERÊNCIAS

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NOTAS:

(1) Para os objetivos desse artigo, o Estado será analisado sob o ponto de vista paradigmático. Thomas Kun conceitua paradigma como “realizações cientificas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência. KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2000. p. 43.
Para Menelick de Carvalho Netto, a noção de paradigma apresenta um duplo aspecto: o primeiro deles seria a possibilidade de explicar o desenvolvimento científico como um processo de rupturas e/ou, que se verifica mediante rupturas. E o segundo seria a possibilidade de se valer de “óbvias simplificações” que: “só são válidas na medida em que permitem que se apresente essas grades seletivas gerais pressupostas nas visões de mundo prevalentes e tendencialmente hegemônicas em determinadas sociedades por certos períodos de tempo e em contextos determinados. A adoção da análise paradigmática se justifica, pois através dela é possível fazer essa simplificação válida que possibilita a percepção de como se dá a relação entre direitos fundamentais e o Estado e de como essa interação é relativamente recente e tem se mostrado conflituosa. Essa análise, no entanto, envolve uma perspectiva eurocêntrica, mas que continua sendo válida para o cenário brasileiro, já que as instituições nacionais absorveram muito dessas formas de ordenação social. CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 476, mai., 1999.

(2) LOPES, Othon de Azevedo. Fundamentos da Regulação. 2018. p.13.

(3) SARLET, Ingo Wolfgang; Eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos Direitos Fundamentais na perspectiva constitucional. 12ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2015

(4) José Afonso da Silva defendia a eficácia limitada dos direitos sociais, em razão da vagueza de seus enunciados linguísticos. Em suas palavras: “A eficácia e aplicabilidade das normas que contêm os direitos fundamentais dependem muito de seu enunciado, pois se trata de assunto que está em função do Direito positivo. A Constituição é expressa sobre o assunto, quando estatui que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Mas certo é que isso não resolve todas as questões, porque a Constituição mesma faz depender de legislação ulterior a aplicabilidade de algumas normas definidoras de direitos sociais, enquadrados de direitos fundamentais. Por regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata, enquanto as que definem os direitos econômicos e sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípios programáticos e de aplicabilidade indireta, mas são tão jurídicas como as outras e exercem relevante função, porque, quanto mais se aperfeiçoam e adquirem eficácia mais ampla, mais se tornam garantias de democracia e do efetivo exercício dos demais direitos fundamentais.” SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. P.163-164.

(5) A afirmação é de SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p.374.

(6) Ibid.

(7) Vitorelli conceitua litígios irradiados como: “a situação em que as lesões são relevantes para a sociedade envolvida, mas ela atinge, de modo diverso e variado, diferentes subgrupos que estão envolvidos no litígio, sendo que entre eles não há uma perspectiva social comum, qualquer vínculo de solidariedade. A sociedade que titulariza esses direitos é fluida, mutável e de difícil delimitação, motivo pela qual se identifica com a sociedade como criação. VITORELLI, Edilson. Levando os conceitos a sério: processo estrutural, processo coletivo, processo estratégico e suas diferenças. p. 3.

(8) Ibid. p. 6.

(9) FERRARO, Marcela Pereira. Do processo bipolar a um processo coletivo estrutural. 2015. p.14.

(10) FISS, Owen M. The Forms of Justice Harvard Law Reviw, v. 93, n.1-58, nov. 1979. p.23

(11) Ibid., p.18-24.

(12) SHARP, N. Wrongful System Rights Violations and the Potential of Court-Sponsored Structural Reform. 1999. 208p (Mestrado). Universidade McGill, Montreal, Canadá. p. 19

(13) MELNICK, R. Shep. Courts and Agencies. In MILLER, Mark C; BARNES, Jeb. (Org.) Making Policy, Making Law: an interbranch perspective. Washington: Georgetown University Press, 2004, p. 98. 67

(14) Camila Porfiro ressalta que ainda que o termo Adjudicação em português esteja mais relacionado à relações de posse e propriedade é correto sua extensão para o sentido utilizado na língua inglesa, onde o juiz ao julgar um caso concreto aplica uma solução, entre outras possíveis, para a controvérsia em questão. PORFIRO, Camila Almeida. Litígios Estruturais – Legitimidades democrática, procedimento e efetividade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018. p.25 28

(15) FISS, OWEN. Two models of adjudication. Op. Cit. P. 761 69 Id.,The forms of justice.

(16) Id, The forms of justice. Op. Cit. P. 3-4. 70.

(17) FRUG, Gerald E. The Judicial power of the purse. Op. Cit. p. 718-719.

(18) Um inventário completo de jurisprudência sobre o tema pode ser encontrado em FRUG, Gerald E. The judicial Power of purse. Op. Cit. p. 724-725 72

(19) (V. e.g., EUA, Suprema Corte. Spallone v. United States, 493 U.S. 265 (1990)).

(20) (V. e.g.,Newman v. Alabama, 683 .2d 1312, 1320-21 (11th Cir. 1982)

(21) LANDSBERG, Brian K. Does Prision Reform Bring Sentencing Reform? The Congress, the Courts, and the Structural Injunction. McGeorge Law Review, v. 46, p. 719-774, 2014, p. 757. No mesmo sentido, cf. MISHKIN, Pul J. Federal Courts as State Reformers. Washington and Lee Law Review, v. 35, p. 949-976, 1978, passim e FRUG, Gerald E. The judicial Power of the purse. Op. Cit.

(22) LANDSBERG, Brian K. Does Prision Reform Bring Sentencing Reform? The Congress, the Courts, and the Structural Injunction. McGeorge Law Review, v. 46, p. 719-774, 2014, p. 757. No mesmo sentido, cf. MISHKIN, Pul J. Federal Courts as State Reformers. Washington and Lee Law Review, v. 35, p. 949-976, 1978, passim e FRUG, Gerald E. The judicial Power of the purse. Op. Cit.

(23) PORFIRO, Camila Almeida. Litígios Estruturais – Legitimidades democrática, procedimento e efetividade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018. p.34

(24) VARGAS, Beatriz; Zackseski. O descumprimento da lei penal no Brasil pelo próprio Estado. P.10

(25) SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. P. 109.

(26) RODRIGUEZ-GARAVIOTO, César; Franco, Diana Rodríguez. Cortes y cambio social: como la corte constitucional transformo el desplazamiento forzado em Colombia. Bogotá: centros de estudio de Derecho, Justicia y Sociedad, Desjusticia, p. 16.

(27) VARGAS, Beatriz; Zackseski. O descumprimento da lei penal no Brasil pelo próprio Estado.

(28) CAMPOS, apud SILVA, Iúri, 2019, p. 5. SILVA, Iúri Daniel Andrade de. Estado de Coisa Inconstitucional, Litígios estruturais e Compromisso Significativo: uma análise à luz do modelo processual colaborativo.

(29) SILVA, Iúri Daniel Andrade de. Estado de Coisa Inconstitucional, Litígios estruturais e Compromisso Significativo: uma análise à luz do modelo processual colaborativo.

(30) RODRIGUEZ-GARAVIOTO, César; FRANCO, Diana Rodríguez. Cortes y cambio social: Cómo La Corte Constitucional transformo El dezplazamiento forzado em Colombia Op. Cit. p. 20.

 

 

 

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