Da Gratuidade Processual e da Desnecessidade da Juntada da Declaração de Pobreza Frente ao NCPC

Vinícius Mendonça de Britto – Advogado. Especialista em Direito Penal e Processual Penal e Ciências Ambientais.

 

RESUMO: Neste artigo estudaremos sobre a desnecessidade da juntada da declaração da pobreza de acordo com o NCPC, bastando declarar na própria petição inicial. Abordaremos a necessidade de constar poderes específicos no instrumento de procuração para requerer as benesses da graça, analisando o entendimento dos tribunais quanto a simples afirmação, na própria petição inicial ou no curso do processo.

PALAVRAS-CHAVE: processo civil; justiça gratuita; desnecessidade da declaração de pobreza; procuração com poderes específicos; exceção; jurisprudência.

 

SUMÁRIO: Introdução – 1. A gratuidade processual – 2. Da declaração de pobreza – Conclusão – Referências.

INTRODUÇÃO

O artigo foi elaborado analisando a doutrina, legislação e a jurisprudência pátrias. A gratuidade processual é concedida pelo juiz da causa, abrangendo as custas e despesas processuais. No percorrer do texto, poderá perceber que o novo sistema de concessão adotado no novo Código Processual Civil não faz exigência da juntada da declaração de pobreza, tornando-se esta, uma peça facultativa do advogado, salvo se este não possuir procuração com fins específicos para requerer em seu nome.

1. A GRATUIDADE PROCESSUAL
A assistência jurídica integral está prevista no inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal, portanto, não se confunde com a gratuidade processual prevista na Lei nº 13.105/2015.

Assim, temos que a gratuidade processual tratará da dispensa dos recolhimentos das custas e despesas processuais, seja ela de forma parcial, total ou parcelada, desde que sejam necessárias para o andamento do processo.

Já a assistência judiciária é toda representação de direitos tanto em juízo, quanto no patrocínio da causa, prestado quase sempre pela Defensoria Pública.

Para a Constituição Federal, o interessado tem de comprovar a insuficiência de recursos e, com isso, se valerá da Defensoria Pública.

É este o ensinamento que se abstrai da doutrina de Pontes de Miranda:

Assistência judiciária e benefício da justiça gratuita não são a mesma coisa. O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que promete a prestação jurisdicional. É instituto de direito pré-processual. A assistência judiciária é a organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. É instituto de direito administrativo. (Comentário ao Código de Processo Civil. 2. ed. Forense: Rio de Janeiro, t. I, 1958. p. 460).

Temos, então, que toda pessoa tem o direito de buscar a justiça, assegurado por nossa carta mãe de 1988, para obtenção de uma resposta.

Pensamento este adotado também pelo legislador no NCPC, em seu artigo 98.

2. DA DECLARAÇÃO DE POBREZA
Aqui, limita-se, a saber, se, com o novo Estatuto de Processo Civil a gratuidade da justiça continua a depender da declaração de próprio punho do beneficiário, ou tal declaração de pobreza não se faz mais necessária para sua concessão.

Pois bem. Nos primórdios, consoante se registrou precisava ele (o requerente da gratuidade) obter atestado de autoridade pública. Mais tarde, a apresentação do atestado passou a ser dispensada para quem exibisse carteira de trabalho, à vista da qual o juiz pudesse apurar a carência (Lei nº 6.654, de 30.05.1979). A evolução atingiu o ápice com a Lei nº 7.510, de 04.07.1986, que modificou a redação do art. 4º da Lei nº 1.060, para estabelecer que a pura e simples declaração do interessado, de não estar em condições de custear o feito sem prejuízo próprio ou da família, geraria em seu favor a presunção relativa de necessidade (antes, já nesse sentido, mas em termos menos específicos, o art. 1º, caput, da Lei nº 7.115, de 29.08.1983). (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O direito à assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 52-53. (Temas de direito processual – Quinta Série)).

Com a entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015, houve revogação do artigo 4º da Lei nº 1.060/1950, o qual deixou de existir, conforme disposto no artigo 1.072, opus citattum: “Art. 1.072. Revogam-se: […] III – os arts. 2º, 3º, 4º, 6º, 7º, 11, 12 e 17 da Lei nº 1.060, de 05 de fevereiro de 1950; […]”.

Com a revogação do art. 4º da Lei 1.060/1950, passam a vigorar os novos artigos que tratam da gratuidade da justiça (arts. 98 ao 102 do NCPC), a partir do dia 18 de março de 2016.

Dos artigos cita-se o 98 e 99 do CPC, os quais dizem:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.

§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

É de fácil constatação, que o parágrafo 3º do art. 99 aduz que se presume verdadeira a “ALEGAÇÃO” de insuficiência.

Temos então, que a “alegação” tratada no parágrafo 3º, caminha simultaneamente com o “caput” do art. 99.

Sendo assim, temos que “a alegação” que trata o parágrafo 3º do art. 99 do Código “Buzaid”, é aquela formulada na peça de defesa, tornando-se, desta forma, desnecessária a juntada da “declaração de pobreza”.

Temos então, que com a entrada do Novo Código de Processo Civil, não se faz mais necessária a declaração do estado de pobreza, bastando apenas, que o advogado o faça na primeira manifestação da parte no processo ou em seu curso.

Usando das palavras sempre seguras e sábias do eminente e saudoso Desembargador Rubens Bergonzi Bossay, o qual sempre dizia em suas decisões “FECUNDA É A JURISPRUDÊNCIA”, assim só nos resta trazer decisão neste sentido, senão vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DO ESTADO DE POBREZA: DESNECESSIDADE.

1. A juntada da declaração do estado de pobreza é dispensável à concessão da assistência judiciária gratuita, bastando a declaração feita na própria petição inicial. 2. Apelação provida. (TRF 3ª – AC 9707/SP – 2008.61.03.009707-1 – Rel. Desembargador Federal Fabio Prieto).

O pedido de assistência judiciária gratuita previsto no art. 4º da Lei 1.060/1950, quanto à declaração de pobreza, pode ser feito mediante simples afirmação, na própria petição inicial ou no curso do processo, não dependendo a sua concessão de declaração firmada de próprio punho pelo hipossuficiente. (REsp 901685/DF, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJe 06.08.2008).

Na linha da jurisprudência deste Tribunal, e nos termos da própria lei, faz jus a parte aos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado sem prejuízo próprio ou de sua família. (REsp nº 172.577/SP, Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira – publicado em 28 de setembro de 1998).

O pedido feito pelo advogado na peça de defesa supre a ausência de declaração da parte, sendo este responsável pela sua afirmação, inclusive porque a falsa alegação de hipossuficiência, a qual altera a verdade dos fatos, acarreta a sanção de litigância de má-fé previstas nos artigos 80, II, 81, 100, parágrafo único, todos do CPC.

Antigamente, era necessária a juntada da declaração de pobreza, pelo declarante, a fim de informar não possuir condições econômicas e financeiras para efetuar pagamento de custas e despesas processuais, sem o seu comprometimento e de sua família, fazendo assim, prova junto ao Poder Judiciário.

Todavia, com a entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015, em seu artigo 99, caput, § 3º, mudou-se tal entendimento, tornando-se desnecessária a juntada da Declaração de Pobreza, de modo que a simples afirmação feita pelo próprio advogado no corpo da petição, já é suficiente para concessão do benefício.

Assim, a juntada da declaração de pobreza torna-se peça facultativa do Advogado.

Desse modo, a declaração firmada pelo advogado da parte, é suficiente para a concessão da gratuidade processual, desde que conste no instrumento de procuração poderes específicos.

Aqui, vigora o que se encontra escrito no texto da lei. No caso do NCPC, o artigo 105 é claro em nos dizer, opus citatum:

Art. 105. A procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica.

Fortíssimo é o repositório doutrinário que acompanha o entendimento jurisprudencial, abaixo exposto, posicionando com justiça e sabedoria a fatos como esse, senão vejamos:

“Entretanto, o advogado necessita, ao contrário do que ocorre sob a égide da LAJ, de poderes especiais para tanto, consoante em cláusula específica (art. 105, NCPC).” (Novo CPC – Análise doutrinária sobre o novo direito processual brasileiro. 1. ed. Campo Grande: Contemplar, v. I, 2015. p. 325).

Uma vez que não é nova a questão em discussão, amoldam-se aqui, os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PEDIDO FORMULADO PELA PARTE EM PETIÇÃO INDEFERIDO PELO TRIBUNAL ESTADUAL. EXIGÊNCIA DE ASSINATURA POR ADVOGADO DOTADO DE PODERES ESPECIAIS PARA TANTO, BEM COMO DE APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO DE POBREZA. DESCABIMENTO. LEI Nº 1.060/1950, ART. 4º, § 1º.

I. Basta à postulação da assistência judiciária a apresentação de petição ao juiz da causa, sem necessidade de sua instrução com declaração de pobreza pelo beneficiário ou que aquela venha subscrita por advogado munido de poderes especiais para tanto. II. Inexistindo, de outro lado, indicação pelo acórdão de elementos nos autos incompatíveis com a pretensão, e, tampouco, impugnação da parte adversa, é de ser deferida a gratuidade requerida. III.

Recurso especial conhecido e provido, para, afastada a deserção do agravo de instrumento, determinar à Colenda Corte estadual que prossiga no seu julgamento. (REsp 655.687/MG, 4ª Turma, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJ de 24.04.2006) […]. (REsp 633.212/SP, Relª Ministra LAURITA VAZ, julgado em 10.06.2009, DJ 19.06.2009).

Entende-se, como dito alhures, que a parte pode formular o pedido de gratuidade processual, por intermédio de seu advogado, desde que, outorgue poderes especiais específicos para declarar e requerer a gratuidade processual.
A declaração de pobreza não é requisito para o deferimento do benefício, conforme extrai-se da leitura do art. 99 da Lei nº 13.105/2015, motivo pelo qual, entendem-se equivocados pensamentos contrários.

Como toda regra há uma exceção, esta também não poderia ser diferente, ou seja, caso o advogado do beneficiário não possua poderes específico para requerer – assinar – declarar a gratuidade da justiça, torna-se obrigatória a juntada nos autos do pedido da declaração de pobreza, firmada de próprio punho pelo beneficiário.

Não basta a simples formulação de hipossuficiência na defesa, se não constar no instrumento de procuração poderes especiais específicos para realizar, em nome do beneficiário, o requerimento da gratuidade da justiça.
Neste sentido, verbis:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA GRATUITA. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE POBREZA DE PRÓPRIO PUNHO. INEXISTÊNCIA DE OUTORGA EM PROCURAÇÃO DE PODERES ESPECIAIS PARA ESTE FIM. DOCUMENTO ESSENCIAL. ÔNUS DO RECORRENTE.

1. A inexistência de poderes especiais ao patrono da parte, para declarar carência de recursos financeiros frente às custas processuais, demanda a juntada de declaração firmada de próprio punho pelo requerente, na medida em que há assunção de responsabilidade pela veracidade da mencionada declaração, sob as penas da lei. 2. Negado seguimento ao recurso.

(TJSP – Agravo de Instrumento nº 0193955-16.2011.8.26.0000, 18ª Câmara de Direito Privado, j. 09.11.2011).

A Lei nº 13.105/2015 autoriza a desnecessidade da juntada da declaração de pobreza, salvo quando o advogado não possuir poderes em sua procuração para requerer a gratuidade da justiça.

Pois, caso não possua em seu instrumento de procuração poderes especiais específicos para requerer as benesses da graça, fica obrigado a juntar com seu requerimento a declaração de pobreza.

No caso do processo já encontrar-se em andamento e a parte necessitar pleitear as benesses, nada o impede de fazê-lo por simples petição, a qual deve ser feita nos próprios autos, conforme disposto no art. 99, parágrafo 1º, do atual CPC.

D’outro viso, temos que o atual CPC buscou com a nova redação torná-la mais simplificada.

A presunção de pobreza, para fins de concessão da gratuidade processual, possui caráter relativo, podendo ser somente indeferido pelo magistrado, caso exista prova concreta e alicerçada em sentido contrário, ou seja, elementos que evidenciem a falta de pressupostos para sua concessão.

Entende-se que direcionar ao juízo a determinação ou não da comprovação, auxiliaria o casuísmo e a insegurança jurídica, além de atropelar a parte contraria de promover a defesa cabível para suspender as benesses pleiteadas, pois cabe à parte contrária provar a ausência da necessidade alegada pelo beneficiário. (art. 100 do Código Buzaid).

Uma vez concedido a gratuidade, a parte ex adversa poderá impugná-la, devendo fazê-la nos próprios autos, por meio de petição simples, para que no prazo de 15 (quinze) dias, comprove o quantum satis, a mendacidade da formulação do pedido de gratuidade do beneficiário, sob pena de ser rejeitada sua impugnação.

CONCLUSÃO
Buscou-se trazer uma reflexão sobre a gratuidade processual frente ao Novo Código de Processo Civil – NCPC, tendo em vista que a Lei nº 13.105/2015 inova este tema, trazendo poderes específicos ao advogado para requerer e assinar a alegação de insuficiência econômica no corpo da peça de defesa, quando a parte for realmente necessitada.

Entende-se ser desnecessária a juntada aos autos da declaração de pobreza, desde que conste no instrumento de procuração os poderes para requerer a gratuidade da justiça e assinar declaração de hipossuficiência econômica do outorgante.

Caso contrário, em que não haja no instrumento de procuração, os poderes, para tanto, deverá o advogado acostar juntamente com seu requerimento de gratuidade a juntada da declaração de pobreza.

__________________________________________________________________________________
THE FREE JUSTICE AND THE AVOIDANCE OF JOINED THE DECLARATION OF POVERTY ACCORDING TO THE NCPC

ABSTRACT: In this article we will study about the avoidance of joined the declaration of poverty according to the NCPC, it is enough declare in statement of claim. We will discuss the need to contain specific powers in the power of attorney to require the blessings of grace, analyzing the courts’ understanding of how the simple statement in the application or in the course of the process.

KEYWORDS: civil procedure; free justice; avoidance of declaration of poverty; power of attorney with specific powers; case law.
__________________________________________________________________________________

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República. Artigos 5º, inciso LXXIV, 6º, 98, 99, 100, 105.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. O direito à assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. São Paulo: Saraiva, 1994. (Temas de direito processual – Quinta Série).

PONTES DE MIRANDA. Comentário ao Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, t. I, 1958.

SANTANA, Alexandre Ávalo; ANDRADE NETO, José de. Novo CPC – Análise doutrinária sobre o novo direito processual brasileiro. 1. ed. Campo Grande: Contemplar, v. I, 2015.

 

 

Deixe um comentário

Carrinho de compras
Rolar para cima
×